Sunday 15 April 2012

Soneto de separação - Blogagem coletiva Amor aos Pedaços, Desencanto













                            A estrela chorou azul, acrílico s/ tela. Monica Cella.






Soneto de separação  
Vinicius de Moraes



De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante

De repente, não mais que de repente.





Desencanto (deriv. De desencantar)
Desencantar (de des + encantar)
Tirar, desfazer, quebrar o encanto ou o encantamento de; causar decepção, desiludir; achar, descobrir, encontrar coisa perdida ou difícil de achar; fazer aparecer como que por encanto.
Desencantador  (de desencantar + dor)



“Não tô nem aí”...
 A frase por si só já carrega o peso da insensibilidade, da indiferença

...canso de ouvir isso por aí afora, em diferentes formatos. Até nas redes de relacionamento social existem maneiras de expressar essa indiferença pelo semelhante, através de imagens com mensagens direcionadas àquele que fere/feriu.
Cada vez mais isso salta aos meus olhos, ouvidos e coração. Mas que raios de seres somos nós??? Falamos tanto em amor ao próximo, tantos discursos bonitos e blá, blá, blá sobre amar e o escambau e ao mesmo tempo na contramão expressamos tanto desprezo pelo outro. Já reparou nisso?

A frase vem acompanhada de um tom sarcástico, cínico numa tentativa de empurrar o outro (quem me feriu) pra escanteio. Colocá-lo na geladeira da indiferença, no compartimento dos malvados e mal amados. Geralmente é colocada quando um impacto negativo vindo do outro interfere num relacionamento, num sentimento, seja ele de qualquer natureza. De perto ou distante, superficial ou profundo. Quando alguém fala que não está se importando com a conduta do outro isso também tem o mesmo significado negativo, porém na contramão da ofensa. Uma postura de fechamento, um muro imaginário que se constrói bem ali de imediato diante do outro. Uma recusa de aceitação, uma tentativa de proteção em última instância. Se devolvo negatividade diante de uma ofensa ou algo que me fere também estou contribuindo com minha parcela de agressividade, na mesma medida de quem está ferindo. Às vezes é difícil perceber isso, que são dois caminhos na mesma direção: negatividade, egoísmo e sentimentos aniquiladores.
Um auto engano obviamente. Uma pseudo fuga pra lugar nenhum, tentando se proteger desesperadamente da dor e da ferida.  Do desencanto causado.
Eu não consigo ficar indiferente ou aceitar essa postura de quem não se deixar atingir, ou faz de conta que tanto faz. Que a maldade alheia, a hipocrisia alheia, o egoísmo alheio e outras tantas situações negativas a que estamos expostos não tem efeito sobre mim. Eu sofro com isso sim. Eu desencanto com o meu semelhante. È algo que fere uma parte que ainda acredita, uma porção quase criança, quase inocente, que ainda tem fé na possibilidade de um mundo melhor. É desencanta + dor...( repare na construção da palavra) observar a indiferença e a frivolidade com que muitos tratam seu semelhante ou seus relacionamentos. Entre amigos, colegas, parceiros, irmãos, com o porteiro do prédio, com a professora/or do filho, com o vizinho, o atendente do supermercado, o garçom e por aí vai...

Depois de algum tempo aprendemos a lidar melhor com a vulnerabilidade da exposição e apesar da dor é algo que não paralisa, nem emudece. Aprendemos que a defensiva ou o contra ataque nem sempre é a melhor medida. Aprendemos que permitir-se ser tocado, atingido pelo outro (mesmo em situações negativas) pode maximizar nossas (boas) defesas. Conseguimos construir não um muro que separa, mas uma casa interna que fortalece. Aprendemos a enxergar que a maldade do outro é tão somente uma parte dolorida dele mesmo que ficou enrijecida por falta de amor, de afago, de aceitação, de tolerância e outras tantas possibilidades não realizadas. O desafeto e a violência são apenas manifestações de feridas ainda expostas, que ainda sangram.