Monday 26 September 2011

ISTAMBUL, TURKEY


Istambul caleidoscópica, a cidade das sete colinas...





Algumas cidades provocam suspiros, assim que você chega já fica impactado, tomado por sua beleza visível, suas paisagens de encanto. Outras nem tanto, ocultam seus mistérios, escondem-se sob um véu a ser descoberto. Não se exibem descaradamente, nem fazem alarde de sua beleza. A modéstia é seu mote. Acho que isso tá relacionado diretamente com sua cultura, mas nem por isso deixam de ser belas.
A minha Istambul é assim, uma cidade sem exclamações, interjeições ou algo do gênero. Uma cidade para ser descoberta aos poucos, feita de paisagens imaginárias construídas nas memórias do tempo, nos meandros do espaço. Feita de cheiros, sons, cores e sabores. Uma cidade que ora se mostra ora se esconde.
Caminhando pelas ruas de Sultanahmet o bairro histórico de Istambul - onde está a maioria das atrações históricas - a imaginação se torna companheira constante e os pensamentos voam para lugares perdidos no tempo e no espaço. Em algum momento no passado, poderosos imperadores e sultões, príncipes e reis, concubinas e rainhas viveram, amaram, lutaram, conquistaram, riram e choraram suas dores, alegrias e amores nesse pedaço de chão.
Bizâncio, Constantinopla, Istambul são alguns de seus nomes, que ao longo do tempo foram sendo modificados tal qual o caráter e as feições dos povos que por aqui passaram.
Meus primeiros dias em Istambul foram tentativas desencontradas em buscar uma cidade imaginária e mágica, povoada por personagens fantásticos que habitavam desde sempre minha imaginação desde as aulas de história na época de adolescente. Onde encontrar algo que só existe dentro de si mesmo? Que permeia memórias longínquas de um tempo que pra mim nunca chegou a existir de fato? Afinal é composto do mesmo material dos sonhos...
Apenas vestígios e rastros, pegadas etéreas aqui e ali de um passado tão longe que chega mesmo a parecer ficção.
Na verdade, alguns dias depois encontro pistas que me levam ao encontro da minha Istambul, aquela que habitou por tanto tempo meus sonhos. São cheiros, cores, sabores e aromas. Movimentos, ritmos e sons. Coisas de quem tem a cabeça sempre a divagar. Mas assim aconteceu.
A música chorosa e melancólica é a coisa mais forte, tocante. Vem do alto dos minaretes, convocando os fiéis para as preces diárias nas mesquitas, quase um lamento ao Onipresente Allah. Sempre Allah. Tempo de Ramadam (Agosto) de jejum e orações cinco vezes ao dia. As vozes dos vendedores do Mercado de Especiarias anunciam aos berros seus produtos competindo entre si, uma quase briga bem humorada, cheia de vida e animação. O frenético vai e vem de gente se acotovelando pelas ruas estreitas ao lado do mercado. Cheiro de açafrão, curry e pimenta, cheiro de kebab e milho verde vendido nos carrinhos pelas ruas. O gosto doce e suave do lokum, típica iguaria turca. As cores berrantes dos montes de especiarias que grudam nos meus olhos: verdes, vermelhos, amarelos, laranjas. Legumes desidratados pendurados em cachos pendentes, mais parece obra de arte de tão lindos. Gosto delicioso de Simít coberto com gergelim. Cheiro de peixe misturado com maresia que vem do lendário Golden Horn (estreito), logo ali caudaloso passando por debaixo da Ponte Gálata, em direção ao Mar de Marmara. Navegadores mercantes, exércitos triunfantes, comércio de especiarias, descobertas, o mar e amores. Cheiro de urina de gato - nunca vi tanto gato! Espalhados aos montes pela cidade afora. O ruflar das asas das pombas pelas praças sobrevoando a cabeça –alvo dos passantes. As mulheres islâmicas andando braços dados, com suas vestes jilbab, cabeças cobertas pelo hijab, muitas de preto. Cabeças curvadas e olhares baixos. Os homens quase sempre em pequenos grupos, quase, quase a conspirar olhando pela tangente para as ocidentais despudoradas em vestidinhos curtos. O colorido dos famosos tapetes turcos, suas tramas e tranças contando histórias e memórias. Os escritos em árabe, ainda remanescentes de um tempo distante, evocando o Corão e os tempos de Maomé (Muhammad). As orações-lamento dentro das mesquitas, belíssimas! onde homens rezam separado das mulheres.
O céu azul brilhante e o sol caliente guiam meus passos e iluminam meus pensamentos.  Assim continuo a andar e investir na descoberta de suas riquezas e encantos. Cada passo conquistado arrisco a contemplar a idéia de uma Istambul idealizada. Cidade que não existe mais, perdida no tempo. Cidade que se transforma a cada minuto impregnada de tempo presente. Um lugar incomparável sim, único. Cheia de contradições, pessoas, cheiros, barulhos, buzinas, mesquitas e minaretes, trânsito caótico, tapetes mágicos e algumas boas surpresas.
Istambul caleidoscópica, cheia de caminhos e descaminhos, subidas e descidas. A cidade das sete colinas e dos minaretes. Apenas impressões, muitas indeléveis...






Um close na cultura, fatos e atos...

*A escrita árabe está em todos os lugares – A Turquia é um país de maioria mulçumana. Maomé foi quem criou o Islã. Ele nasceu em Meca, cidade sagrada para os islâmicos, situada na Arábia Saudita. Maomé decodificou o Corão em árabe. A Civilização Árabe se desenvolveu sob a proteção do Islã e foi uma civilização da escrita. A escrita especialmente árabe é considerada uma ligação especial com a palavra de Deus e fundamento de vida para os islâmicos;
*95% da poulação de Istambul se diz Islâmica;
* A Turquia é um país laico, secularizado a partir da Republica Da Turquia em 29 de outubro de 1923 por Kemal Atatürk.
*O véu e as roupas femininas - As mulheres islãmicas fazem uma escolha ao usar ou não a jalabib (espécie de túnica comprida e solta) e o hijab (véu que deve cobrir a cabeça e o colo), isso não é mandatório segundo o Islãm. Seu uso se faz com vários intuitos: se despir da vaidade mundana e das aparências, se resguardar dos olhares de desejo dos outros homens (na comunidade islâmica tanto homens quanto mulheres devem se manter virgens até o casamento, portanto a roupa das mulheres funciona como facilitador da castidade). Também significa modéstia e fé em Deus. Atributos altamente valorizados pelos islâmicos.Mas acima de tudo é a representação íntima de uma jornada espiritual na qual a maioria das mulheres acredita.
*O Ramadam acontece uma vez por ano no nono mês do calendário Islâmico que é lunar e não solar.É o mês em  que o Alcorão foi revelado a Maomé. Os islâmicos jejuam da aurora até o por do sol e devem abster-se de comida, bebida (inclusive água) e relações sexuais. È consierado um método de purificação espiritual e auto disciplina. Os fiéis também criam uma empatia com todos aqueles que passam fome, estimulando a caridade.
*Ablução- é um rito utilixado por diversas religiões. É o ato de lavar-se/purificar-se com água. O batismo é uma ablução. Os islâmicos Antes de rezar devem lavar-se a cabeça, os olhos, as narinas, as mãos e os pés. Isso chama-se ablução. È considerado uma higienização do corpo que para eles carrega muitas impurezas.
* Aesop,ou Esopo famoso univeersalmente por suas fábulas era turco, nasceu na Anatólia (Anadolu em turco) a parte oriental da Turquia ou Ásia Menor.
*O Estreito de Bósforo separa a Europa da Ásia, divide Istambul ao meio sendo a parte ocidental fica a Europa e a parte oriental na Ásia;
*As tulipas são originárias da Turquia. Tulipa=turbante. Foram trazidas à Holanda ,pelo Embaixador Ogier Ghiselin de Busbecq, representante de Carlos V da Holanda na corte de Süleyman, o Magnífico.
* Fica em Istambul a histórica estação ferroviária de Sirkeci, última paragem do Expresso Oriente-Simplon, um dos trens mais luxuosos do mundo. Fazia o trajeto entre Paris e Istambul (Constantinopla na época) desde 1883 a 1977;
* As sete igrejas do apocalipse são localizadas onde se encontra hoje a Anatólia: Éfeso, Izmirna, Pergamundo, Tiatira, Sardis, Filadélfia e Laodicea;
* Mustafa Kemal Atatürk (o pai dos turcos) Herói nacional, é uma figura muito reverenciada no país todo. Suas fotos se espalham em todos os lugares. Foi um oficial do exército, revolucionário, estadista e o primeiro presidente da Turquia. Tem os méritos de ser o fundador da República da Turquia em 1923. Revolucionou o país implementando mudanças drásticas na política, economia, educação, cultura e sociedade, transformando a Turquia num Estado-Nação secular, moderna e ocidentalizada.
* A maioria da população vive na porção asiática de Istambul e trabalha na européia. Duas pontes unem ambas as porções da cidade








Saturday 17 September 2011

DERVISHES RODOPIANTES, ISTAMBUL


                      Photo by  Peter Morgan em 28 Dezembro 2008. From Flickr


Dervishes Rodopiantes, uma dança para Deus


Muito tempo atrás ouvi falar pela primeira vez dos Dervixes. Alguma coisa me tocou, mesmo sem saber ao certo quem eram os Dervixes e por que tal tipo de sentimento. Anos depois redescubro-os através de uma amiga da Turquia. Conversando sobre a cultura de seu país fiquei encantada ao escutá-la falar sobre Mevlana Rumi, um místico espiritual de sua religião (o Islã). Mas qual foi minha surpresa maior ao saber que os Dervixes pelo quais eu sempre tive curiosidade e certa atração eram nada mais nada menos do que um legado de Mevlana Rumi. Procurei então conhecer mais a fundo quem foi Rumi, suas idéias, filosofia e também sobre os Dervixes, afinal hoje com o recurso da internet tudo está em nossas mãos, imediatamente. Minha intuição a anos atrás acertou em cheio e adorei conhecer um pouco mais sobre esse fascinante ser que um dia existiu no planeta Terra. Mais legal ainda foi descobrir que eu poderia ver os Dervixes ao vivo, assistir a um ritual dos Dervixes Rodopiantes em Istambul (sua cidade base é Konya, onde Rumi viveu e morreu). E ali estava eu eufórica porque um pouco mais tarde viajaria para a Turquia.
Veja você, que coincidência, algo pelo qual eu tinha muita admiração (mas que se encontrava latente) reaparece por acaso na minha frente. As sincronicidades da vida...


Mas quem são afinal os Dervixes?

A origem dos Dervixes se mistura com a história do Sufismo, uma corrente mística dentro da tradição do Islã. Existem a pelo menos 700 anos e nasceram a partir da existência de um ser iluminado chamado Mevlana Celaleddin-i Rumi  ou Jalaleddin Rumi, também conhecido como Mevlana (O Mestre) (30 setembro 1207- 17 Dezembro 1273).

Rumi nasceu na costa oriental do Império Persa na cidade de Balkh (hoje o Afeganistão) e finalmente se estabeleceu na cidade de Konya, hoje Turquia.
Rumi como é conhecido popularmente, era um muçulmano não ortodoxo. Místico e poeta, um ser que alcançou um estado de perfeição humana, de elevação espiritual. Tolerância ilimitada, bondade, caridade e a consciência através do amor eram seus ensinamentos.
Filho de um rígido estudioso, Rumi seguiu pelo caminho do pai e encontrou nos estudos uma fonte inesgotável de saber. Demonstrou desde cedo ser um ser original com suas próprias idéias e pensamentos. Após anos de estudo constatou-se desiludido com o modo como percebia Deus segundo seus mestres e a tradição da religião.
Rumi ansiava por mais, por algo que superasse os ensinamentos que rezava a tradição. Diz a lenda que foi quando encontrou ao acaso um errante pelas ruas, um ser místico chamado Shams de Tabriz. Imediatamente nasceu um forte relacionamento entre os dois que se diziam almas gêmeas no plano espiritual. Shams era um ser não ortodoxo por excelência, vivo e pulsante. O encontro com Shams provocou um estado de elevação espiritual em Rumi transformando-o verdadeiramente em um místico. Nesse momento ele troca a vida intelectual pela espiritualidade. A sintonia entre os dois era tão forte que chegou a provocar discórdias entre alguns de seus seguidores. A história acaba em tragédia, com o assassinato de Shams. Desolado e em luto profundo, Rumi experimenta uma nova revelação espiritual.
Rumi dizia que devemos quebrar nossos condicionamentos sejam eles de qualquer ordem. Na verdade ele estava além, muito além de seu tempo, de sua cultura e sociedade apesar de se posicionar no contexto da conservadora cultura e religião Islâmica. A essência de sua poesia é o encontro com o divino.

Seus pensamentos atravessaram os séculos e ainda hoje se perpetuam através da Ordem Mevlevi, formada pelos  Dervixes Rodopiantes (Whirling Dervixes).

Sua prática consiste num ritual místico (Sema) em que os Dervishes giram sobre si mesmos e em círculos. A dança é acompanhada por músicos que tocam instrumentos especiais e cantam musicas apropriadas. Cada parte do ritual tem um significado simbólico: as roupas, os chapéus, o manto, a saia branca, as cores, o movimento. Simbolicamente representa uma jornada mística da ascensão espiritual do homem através da mente e do amor até Deus. Abandono do ego, encontro da verdade e o crescimento através do amor.
Segundo os Dervixes o movimento de rotação provoca uma espécie de êxtase. Sua crença baseia-se no movimento rotacional dos elementos essenciais da natureza (átomos, prótons, etc.) todos os elementos da natureza giram intermitentemente. O ritual envolve os três elementos da natureza humana: a mente (conhecimento), o coração (sentimentos, música, poesia) e o corpo (através dos giros do corpo, ativando a pulsão da vida).
A experiência de ver uma cerimônia dos Dervixes nos leva a um estado de contemplação, calma e elevação. Retrata bem a alma da filosofia. Tudo começa no mais absoluto silêncio quando os músicos entram na pequena sala numa quase penumbra. Começam seus cânticos/preces que envolvem e acariciam a alma preparando-a para o momento seguinte. A música é quase plangente, nos leva para lugares além do imediatamente visível. Após certo tempo entram os Dervixes em procissão, não são muitos. Eles fazem então suas reverências. Logo em seguida seguindo o ritual simbólico eles se ajoelham. Depois levantam, retiram seu manto negro (que significa o abandono do ego) e com os braços cruzados sobre o peito - significa o numero um, a unidade com Deus - começam a girar. Da direita para a esquerda. Assim como os planetas giram em torno de si mesmos e em torno do sol. Seus giros são em torno de seu eixo (simbolicamente de seu coração). Seus braços se abrem e se posicionam de modos diferentes conforme os giros avançam. Num determinado momento posicionam a mão direita com a palma para cima, que recebe o amor de Deus. Sua mão esquerda se vira para baixo em direção à terra e transfere o amor recebido para o mundo. Durante o primeiro ciclo do Sema os Dervixes olham para todos os mundos. Libertam-se das dúvidas e alcançam o Divino. No segundo ciclo toda a existência se dissolve na unidade Divina. No terceiro ciclo se purificam e atingem um estado de maturidade. No quarto ciclo atingem um estado da Não-existência dentro da Existência Divina. E assim com o solitário som da flauta a cerimônia termina, com um dos participantes recitando palavras do Corão.

Mas a viagem continua, em cada segundo da vida dos Dervixes seguidores da Ordem Mevlana. Um caminho feito de tolerância e acima de tudo amor.
A cerimônia toda dura mais ou menos 45 minutos divididos em sete partes, cada parte com um significado próprio.
*Atualmente Na Turquia - especialmente em Istambul - as cerimônias Dervixes Rodopiantes são apresentadas ao público como parte de seu patrimônio cultural. Por isso existe até mesmo restaurantes que oferecem a cerimônia como atração aos turistas (questionável). Portanto procure por algo mais próximo do original, se possível. Afinal os Dervixes Sufis se espalham por toda a região Asiática, não só na Turquia. Muitos grupos são na verdade anônimos e fechados. Apenas convidados podem assistir seus rituais. Mesmo assim acredito que vale a pena entrar em contato e assistir em Istambul.
Assistimos num local representativo da cultura local, bem próximo a Sirkeçi Estação de trem. O lugar chama-se HADJAPASHA - Hocapasa Culture Center. A apresentação é feita em um local pequeno em condições apropriadas, condizentes com o intuito da mesma. Recomendo. É aconselhável comprar os ingressos com antecedência. Ou reservá-los nos postos de informação oficiais. Existe um bem próximo a Haja Sophia em Sultanhamet. Tem cerimônias todos os dias às 19:30h (exceto Terça e Quinta).




          Photo from website www.columban.org,au - (didn't find out who is the author)




*Em 2005 a UNESCO proclamou a “Mevlevi Sema Cerimônia” da Turquia como uma das obras primas do Patrimonio Oral e Intangível da Humanindade.
* “Rumi é, também, um nome descritivo cujo significado é "o romano", pois ele viveu grande parte da sua vida na Anatólia, que era parte do Império Bizantino dois séculos antes”. Fonte Wikpedia



*Lugares onde assistir os Dervishes Rodopiantes

*HADJAPASHA - Hocapasa Culture Center -   http://hodjapasha.com/
*SIRKEÇI TRAIN STATION   
*Tente aqui  Yenikapi Mevlevihanesi   - umv@mevlana.net
 *Na cidade de Konya onde existe o Museu Mevlevi. No mês de Dezembro tem um festival     onde existem diversas apresentações da cerimônia.
    

    *VIDEOS FROM YOUTUBE


*Fotos - na cerimônia que assisti em Istambul não era permitido fotografar ou filmar, por isso as fotos que posto aqui foram emprestadas do Google Images com os devidos créditos.
A primeira foto retirei do Flickr e pertence a Peter Morgan ; A segunda foi retirada do website www.columban.org.au não havia nenhuma referência ao autor da mesma.
 *the first picture its by Peter Morgan and its from Flickr; click on the link to access it; the seconde one I didn't find out who is the author, the website where it comes from there wasn't any reference about it, it comes from www.columban.org.au). 


“There is a life in you, search that life, 
Search the secret jewel in the mountain of your body, 
Hey you, the passing away friend, look for with all your strength, 
Whatever you are looking for, look in yourself not around.” 
Rumi
  
Maşallah!